Homilia de Monsenhor João Scognamiglio Clá Dias
na memória de São Tomás de Aquino
Igreja de Nossa Senhora do Rosário, Caieiras, São Paulo.
29 de janeiro de 2010.
Hoje, celebramos esta Eucaristia como abertura de todos os cursos do ano letivo de 2010, com a presença de representantes do corpo discente dos Arautos do Evangelho de toda América Latina e Portugal.
As férias passaram e agora se inicia um novo ano no qual, além de todas as atividades pastorais e vida espiritual que devemos manter, também estaremos postos no estudo. E, portanto, na vida daqueles que estudam, se acrescenta mais uma importante ocupação.
Quem são os que estudam? Não somente os matriculados, todos os Arautos estão na contingência de estudar. Até quando? Até meia hora após a morte. Desta forma, esta cerimônia atinge e abrange a todos que aqui estão. Todos devem estar ocupados no estudo, tanto nos tempos de obrigação, quanto nos tempos livres. Cumpridas as orações e as obrigações sobrenaturais: vem o estudo. Porque, quem se desocupa cai nos piores horrores, pois o ócio é o caldo de cultura, o ambiente, a situação idealíssima para as tentações do demônio, como veremos na liturgia de hoje, a qual, por incrível que pareça, coube à abertura do ano letivo.
É o grande Rei Davi, o amado Rei Davi, o antecessor em linhagem de Nosso Senhor Jesus Cristo, que se desocupa e cai no desastre. Enquanto que nós não. Teremos o ano de 2010 cheios de atividades especialmente de estudos.
E para que todos se compenetrem quanto é vantajosa a vida de estudante, ofereceremos, hoje, esta Santa Missa, tanto mais que já celebramos uma Missa para o corpo docente e agora trata-se de uma Missa para o corpo discente, ou seja, daqueles que irão estudar para aprender, não para ensinar, pelo menos por ora.
[…]
Nesta Santa Missa, na qual se celebra os últimos dias de férias e prenuncia a abertura de um novo ano letivo, cai diante de nossos olhos o sério problema do ócio, o problema de não fazer nada, de estar desocupado. Quem vive desocupado, está à mercê do demônio.
Nesta liturgia, temos presente o risco que se incorre em estar desocupados, e da maravilha que significa ser convocado, à força, a estar ocupado. Digo à força, porque, a não ser que a pessoa seja muito disciplinada ou que possua um dom de Deus de responsabilidade, de humildade, enfim, de ser santo… Se ele ou ela é santo, então terá mais facilidade em ser vigilante e não confiar em si, mas sim na graça. Mas, não significa que não sendo santo não pecará, porque se não for realmente vigilante e humilde, se não tiver uma confiança inteira nas mãos de Deus e, tiver um pingo de confiança em si, cairá. Quem tem confiança em si cai, assinado Davi, o santo rei Davi.
Então, abrimos este ano sendo convocados compulsoriamente ao estudo com provas mensais, com tarefas de casa, com aplicação integral em todas as matérias. Ainda que essas disciplinas tenham a aparência de nunca serem úteis na vida diária, todas têm um papel fundamental: manter ocupado.
O estudo destes temas aparentemente inúteis alarga a inteligência, porque a partir do momento em que somos obrigados a estudar, por exemplo, o movimento de heliotropismo da botânica ou o estudo da constituição das plantas, ainda que não pareça proveitoso de forma imediata à vida concreta e material, aumenta nossa capacidade intelectual.
Ademais, existe também outra vantagem no estudo, através da botânica, podemos contemplar a maravilha da sabedoria de Deus. Podemos contemplar, por exemplo, como o heliotropismo é o símbolo do teotropismo da alma humana. Destarte, tudo que for ensinado é passível de ser aprendido debaixo de um prisma que enriquece a vida espiritual. Muitos ensinamentos parecem ser úteis apenas para o dia da prova, mas se eu souber aplicar a certos momentos da existência posso ter imensas vantagens.
Santo Inácio de Loiola pede em seus exercícios espirituais graça para que “sinta a desordem de minhas operações”. De fato, o homem, por causa do pecado original é um desordenado… Se não for a graça de Deus através da intercessão de Maria Santíssima e de seus santos, somos complemente incapazes de praticar os mandamentos divinos de forma estável, porque nossa natureza é desordenada. Sentir a desordem de minhas operações é experimentar que sou um falido por essência. O homem necessita ter desconfiança de si mesmo, de maneira que, quando insuflado pelo demônio em sua fantasia e sua concupiscência de que é um colosso, deve dar um gargalha de desprezo, solene e sonora, primeiro, ao demônio que mente, e segundo, para si mesmo, por ter a tendência de aceitar o que o demônio diz.
Na vida social é natural que se faça elogios a fim de que o convívio torne-se ameno e afável. Não me lembro que fora do claustro ou da vida religiosa seja feito um elogio a alguém e encontrar, na face ou no olhar, uma convicção de que aquela qualidade vem de Deus.
A capacidade de que a natureza humana tem de aceitar qualquer elogio é enorme. A apetência de ser adorado é tremenda. Contra isto, é necessário ter uma compenetração de nossa deficiência e a importância de manter uma exímia vida espiritual.
Quem se julga mais forte, gênio e culto do que é, na verdade, não vale “dois caracóis”. Pois, este não tem força alguma, se vende por qualquer elogio, se irrita com qualquer crítica, assim, é mais frágil que qualquer menina. Uma menina é corrigida, fica vermelha e abaixa a cabeça, um gigante a quem se faz uma correção, pede a morte, não dorme a noite. Onde está sua força, sua personalidade e a sua glória? Na verdade, o orgulhoso é mais frágil que uma criança.
É o que Santo Inácio recomenda: “pedir a graça de sentir quanto são desordenadas as minhas operações, para que aborrecendo-me me emende e me ordene”. Assim como Davi arrependeu-se, compôs os salmos, fez penitencia e santificou-se, devemos também nós, quando levados pela fantasia e pela concupiscência, pela instigação do demônio, reconhecermos a queda por falta de vigilância, batermos no peito, e com confiança nos confiarmos às mãos de Deus reconhecendo que não somos fortes.
Esta é a abertura do ano letivo, onde teremos muitas ocasiões para praticar a virtude, de não ser preguiçosos, mas sim, a virtude de estar ocupados, constantemente postos na atenção das coisas mais elevadas, das coisas da cultura e da inteligência. Tudo isso é um benefício extraordinário. Cria um ambiente onde a prática da virtude é mais fácil, um ambiente até mais benfazejo do que as férias. Por esta razão, não há um ditado latino que diga studii miseriae, mas sim, outro feriae miseriae.
Portanto, peçamos nesta Santa Missa que todos recebam graça sobre graça a fim de que possam progredir na vida espiritual aproveitando esta maravilha que é o estudo.
Adaptado por: Lucas Antonio Pinatti
Sem revisão do Autor