A Sabedoria dos simples

Redação (11/05/2010, Virgo Flos Carmeli) “Porque pregas de modo tão simplório? Fazes papel de ignorante. Por que não pregas a lo grande como nas cidades? Ah! Como me deleito com estes grandes sermões que não incomodam a ninguém, que deixam as pessoas viverem à seu modo, fazendo o que querem!”[1]. Este foi o elogio que recebeu São João Maria Vianney de uma possessa. Com efeito, sem se incomodar por isto, este santo era tido, por muitos, como sendo falho de inteligência; entretanto, mal sabiam os doutos de sua época que em realidade este varão foi um grande sábio, uma vez que entendia tudo pelas causas altíssimas, ou seja, pela visão de Deus.

De fato, nestes tempos, a etiqueta consistia em fazer sermões baseados em Chateaubriand ou em Lacordaire, tentar imitar a Bossuet, enfim, primar mais por floreios retóricos e por um estilo academista, do que tentar atingir o fundo da alma dos fiéis tendo em vista sua conversão.

Deus, porém, jamais abandona seu povo. Assim, neste período de progresso científico, que foi o século XIX, em plena Revolução Industrial, quando a humanidade esperava tudo das máquinas e do desenvolvimento científico, a Sabedoria Divina suscita um varão que em sua simplicidade arrebata as almas, voltando seus olhos para a verdadeira realidade: o mundo sobrenatural, a ciência da Cruz.

Ao lermos um texto, ou ouvirmos um discurso, esperamos de nosso autor, que tenha mais do que simplesmente “dom”. O que realmente nos atrai é quando percebemos não só o dom, mas sua genialidade. Contudo, há algo ainda mais sublime do que a conjugação de dom e genialidade: é quando constatamos que nosso autor é inspirado. Com efeito, o que nos é mais leve e agradável do que ler as Sagradas Escrituras? Entretanto, não será simples seu estilo?

O mesmo se dava com o Cura de Ars que, obtuso aos olhos do mundo, tornava-se sutil e penetrante com seus exemplos, e maravilhava seu auditório, convidando-o assim à sincera conversão: “Meus filhos, se vós vísseis um homem erigir uma grande fogueira, amontoar galhos uns sobre os outros, e, perguntado-lhe o que está fazendo, ele vos responde: “Estou preparando o fogo que me deve queimar”, o que pensaríeis? E se vísseis este mesmo homem aproximar uma chama dos galhos, e, quando acesa a fogueira, se jogar dentro… o que diríeis? Cometendo o pecado é assim que nós procedemos. Não é Deus que nos precipita nos inferno, somos nós que nos jogamos…”

Não é de se reconhecer nisto uma profunda sabedoria? Não são palavras penetrantes e inspiradas? Não demonstra este santo um grande conhecimento de Deus? Com efeito, o grande Santo Tomás de Aquino – que por certo prisma estaria no oposto de nosso Cura de Ars – nos define: “Sábio se chama, em cada gênero, quem conhece a causa altíssima desse gênero pela qual pode julgar tudo o mais. Sábio, absolutamente falando, é aquele que conhece a causa altíssima absoluta, isto é, Deus. Por isso, o conhecimento das coisas divinas chama-se sabedoria. O conhecimento, porém, das coisas humanas chama-se ciência.[2]”. Tal definição é a própria imagem deste humilde pároco de Ars.

Desta forma, entendemos melhor as palavras de Jesus: “Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado”. (Lc 10, 21)

Michel Six – 3º Ano Teologia


[1] Cf. SAINT PIERRE, 1963, p 192.

[2] II-II Q. 9, a. 2.