Redação (03/11/2011, Virgo Flos Carmeli) Quem contempla a arte romana toma contato com algo do aroma de grandeza do povo que maior influência teve sobre a cultura ocidental. Roma é eterna em seus mosaicos dourados, nas suas portentosas ruínas e nas estátuas de mármore onde se contempla personagens hieráticos que demonstram uma capacidade humana invejável. Lógica, autodomínio e desejo de grandeza são predicados salientes naquelas fisionomias que parecem mais voltadas à eternidade.
As representações dos antigos patrícios parecem mitificar o romano como um herói acima da própria natureza, não como mera utopia, mais com o empenho de refletir algo da alta concepção de plenitude humana admirada por aquele povo que conquistou reinos e impérios, que fez do Mediterrâneo uma propriedade exclusiva, o Mare Nostrum.
Durante cerca de oito séculos, o Velho Mundo viveu sob influência imediata das águias latinas pendentes em seu vitorioso estandarte. Ainda hoje esta civilização é admirada em sua engenhosa arquitetura, em suas técnicas militares, em sua arte de governar os conquistados, na ordem admirável do seu Direito, na sua arte secular e na riqueza da literatura.
A perenidade da cultura romana é vista, por exemplo, no latim, o idioma da cultura. Durante séculos foi usado nas universidades para transmitir o conhecimento humano. Inclusive após as invasões, quando as províncias cederam lugar aos reinos germânicos, a língua de Cícero espalhou-se por toda Europa e se manteve pelos séculos através do inegável contributo da Igreja.
Os povos latinos, legítimos e imediatos herdeiros de Roma, espalharam as línguas românicas por todos os continentes. Cerca de metade da população mundial usa o alfabeto latino, e quase um terço da superfície terrestre é habitado por povos que tem por idioma uma das línguas românicas.
Roma é eterna. Entretanto, esta grandiosa perenidade do Império abrigou dois modos de conceber o espírito romano. Duas cidades disputavam abertamente a herança dos gloriosos antepassados do Lácio: Roma e Bizâncio. Ambas reluzem qualidades específicas nas expressões artísticas, nas formas de governo e na mentalidade de cada cidadão.
Com o decorrer dos séculos, esta diferença foi se solidificando até o momento no qual, com a divisão do império em 395, a parte oriental passou a ser conhecida como Bizantina. Púrpura, cerimônia e esplendor lhe eram palavras correlatas. A erudição, a inteligência e a diplomacia de Bizâncio procuravam afirmá-la como única herdeira da cultura helênica e da grandeza latina.
Roma ou Bizâncio, quem haverá herdado a totalidade do espírito do Império? Como a um historiador poderia definir a diferença psicológica dos romanos orientais e dos ocidentais? Qual era, em última análise, o desígnio de Deus a respeito desta maravilha de lógica, esplendor e grandeza vivida com matizes diversos, mas harmônicos pelas duas capitais?
Em uma conferência sobre a Visão da história: o plano de Deus quanto ao Império Romano do Oriente e do Ocidente, Prof. Plinio Corrêa de Oliveira discorre sobre a vocação de uma das maiores civilizações da História:
“O Império do Oriente, sobretudo Bizâncio, parece-me ter sido chamado a realizar o ideal do Império uno e cristão, católico, mais do que Roma e o Império do Ocidente, o qual já estava em decadência e não tinha mais o brilho do Império do Oriente.
Em meio às corrupções e horrores, Bizâncio teve uma indiscutível grandeza, herança do Império Romano, com sua força, lógica e espírito de organização acrescidos da graça do batismo. E por isso com um pulchrum próprio, que não chegava a ser o de uma sociedade orgânica perfeita; esta deveria ter essa grandeza natural, porém aprimorada pela graça que, sendo amiga da natureza, pousa sobre ela e a sacraliza, dando-lhe fulgores próprios, os quais não excluem a glória natural que, de acordo com um desígnio da Providência, se tenha acumulado.
O Império Cristão do Ocidente parece-me ter sido chamado a representar mais a força enquanto vencendo. E o do Oriente, a força já vitoriosa que se inclina sobre os escombros daquilo que ele havia derrotado e, não mais com temor, mas com amor, vai selecionando de dentro deles coisas para adornar a sua própria glória. De maneira que há um quê de síntese no Império Romano do Oriente”[1].
Nesta conferência o insigne professor brasileiro conclui que as glórias de Roma e de Constantinopla serão objeto de contemplação inclusive no Céu, pois somente na ultravida poder-se-á atingir a plena concepção da grandeza deste Império que desde seus primórdios estava consciente de que nascera para ser eterno.
Marcos Eduardo Melo dos Santos
[1] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. O Império Romano nos planos de Deus. Revista Doutor Plinio, São Paulo. Editora Retornarei, julho de 2011, pp. 23-24.