A Santíssima Trindade: Um mistério razoável (Parte II)

 Um mistério que nossa inteligência não consegue compreender

Redação (09/06/2011, Virgo Flos Carmeli) Nossa inteligência nunca teria sido capaz de excogitar ou descobrir que Deus é Trino e Uno, se o próprio Deus não tivesse tomado a iniciativa de nô-lo revelar. Mas, sendo uma verdade tão excelsa, mesmo depois de revelada por Deus, continua sendo para a nossa inteligência um mistério, “oculto sob o véu da fé e envolto, por assim dizer, numa certa obscuridade”[1]. Em outras palavras, nossa compreensão dele é apenas parcial, mesmo quando o aceitamos como parte da mensagem de Deus.

Santo Agostinho, Padre da Igreja, dotado de brilhante inteligência, certa vez pôs-se a meditar a respeito desse mistério.  Andava na praia, de um lado para o outro, pensando:  “Como pode ser isso?  Um Deus em três pessoas?  E cada uma delas é Deus! Não consigo entender !”. Durante horas caminhou à beira mar matutando, refletindo longamente sobre esse mistério, até que, em certo momento, deparou-se com um menino que fazia algo que lhe chamou a atenção. O garoto tinha cavado um buraco na areia e, com um pequeno balde, recolhia água do mar para enchê-lo. Ia e vinha do mar até o buraco, vertendo dentro deste toda a água que trazia. S. Agostinho observando que o menino não se cansava de buscar água para encher o pequeno orifício, não se conteve e dirigiu-se a ele com as seguintes palavras:

– Meu filho, o que você está fazendo?

– Padre, estou tentando colocar toda a água do mar dentro deste buraco.

– Mas, meu filho, você não percebe que o buraco é minúsculo? Veja como é gigantesco o mar! Não cabe dentro desse buraco. Além disso, toda a água que você coloca dentro dele é reabsorvida pela areia e volta para o mar. Você está querendo fazer algo que é impossível!

Ao ouvir isso, o menino retrucou em tom solene:

– Agostinho, Agostinho! É mais fácil que toda a água do imenso mar caiba dentro deste minúsculo orifício, do que a infinidade do mistério divino da Santíssima Trindade caiba em sua cabeça.

Dito isso, o menino desapareceu. Era um anjo que tinha vindo ensinar ao santo que por mais que nos esforcemos nossa inteligência nunca conseguirá compreender a Santíssima Trindade.

Mistério não contrário à razão

O fato, porém, de não conseguirmos compreender esse mistério, não significa que ele seja contrário à razão.

A criação, sendo obra de Deus, traz a marca do seu Autor, assim como certos quadros revelam quem os pintou. Uma pintura de Fra Angélico é bem diferente de um quadro de Zurbarán. Um bom entendedor de arte percebe num relance quem é o autor de uma obra ou de outra, pelas características das mesmas.

Ora, certas coisas criadas refletem de algum modo o mistério da Santíssima Trindade. Tomemos por exemplo, a chama de uma vela. A chama é composta de luz, calor e movimento. São três coisas distintas, cada uma com uma característica própria: a luz ilumina, o calor aquece e o movimento dá aparência de vida.  Mas se alguém nos disser: “— por favor, separe a luz do calor”, responderemos que é impossível. Igualmente responderemos, se nos disser “— então separe a luz do movimento, ou separe o calor do movimento”. São operações impossíveis. Luz, calor e movimento são uma só chama.  Três coisas numa só chama.

Esse exemplo nos mostra, portanto, que algo uno e trino não é contrário à razão.  Logo, o mistério da Santíssima Trindade não é contrário à razão.

Há outros elementos na criação que refletem o mistério da Santíssima Trindade. O sol, por exemplo, está no firmamento e produz luz e calor; a luz e o calor não são distintos do sol. A Trindade é algo parecido: o Filho e o Espírito Santo são iguais em natureza ao Pai, mas são um só Deus. O Pai é Deus, o Filho é Deus e o Espírito Santo é Deus. Três pessoas e um único Deus.

A água pode ser encontrada em estado sólido, líquido e gasoso.  Mas em qualquer desses estados, a natureza é a mesma, isto é H2O.

Também encontramos na natureza humana uma imagem da Santíssima Trindade;  adiante explicaremos em que sentido.

(Continua no próximo post)

Ronaldo Baccelli

Revisão: G. de Ridder


[1] Concilio Vaticano I, Constituição “De fide catholica.”, iv