Redação (18/11/2013, Virgo Flos Carmeli)
I – São Marcos
A palavra “Evangelho” vem do grego “evangélion”, que significa “Boa Nova”. A Igreja reconhece oficialmente quatro narrações do Evangelho, ou seja quatro são os Evangelhos Canônicos: os de São Mateus, São Marcos, São Lucas (chamados “sinóticos” pois podem ser lidos em sinopse, ou em três colunas paralelas), e o de São João (assaz diferente).
Há também outros escritos chamados apócrifos, mas que não são reconhecidos pela Igreja como inspirados pelo Espírito Santo. Se comparamos estes com os canônicos veremos que diferem, pois são exuberantes, tendem a mostrar um “Jesus maravilhoso”, ao passo que os reconhecidos pelo Magistério são muito sóbrios, não precisam “ornamentar” a figura de Nosso Senhor, pois seus autores os sabem aceitos por seus leitores.[1]
São Marcos não foi um dos doze apóstolos, mas discípulo destes, em especial, São Pedro.
É o segundo, e o mais breve dos Evangelhos sinóticos, conta com 673 versículos, enquanto que São Mateus 1068 e São Lucas 1149.
Durante muito tempo ele foi um dos evangelistas menos comentados, porém aos poucos chamou a atenção pelo fato de que se julgou ser ele o mais fiel narrador. Seu estilo de escrever é o mais simples dentre os evangelistas. [2]
Sabe-se que seu Evangelho é destinado não para os judeus, mas para os pagãos convertidos ao Cristianismo.
Talvez por ter sido batizado por São Pedro, e por tê-lo seguido em diversas viagens, este ocupa um lugar saliente em seu evangelho.[3]
Porém muitas vezes esta “saliência” não é muito favorável ao primeiro Papa, e aqui encontramos uma primeira prova da veracidade de seus escritos. Pois, com efeito, se São Marcos quisesse inventar um mero mito, ou um conto, o lógico é que o faria de modo a ressaltar-se, a si e ao que lhe diz respeito… como o faz geralmente os falsários, para que assim seja aceito e venerado por seus adeptos, e que escondesse tudo o que lhe possa prejudicar. Entretanto não é assim, pois apesar de ser ele discípulo de São Pedro, ressalta as faltas deste (Mc.: 8, 32; 14, 66-72; ). Como se não bastasse ressaltar as deficiências, ele vela os méritos, assim vemos que, por exemplo a promessa do primado de São Pedro, por ele não é narrada.
II- Provas históricas de seus escritos
Encontramos testemunhos de vários autores antigos a respeito da autenticidade dos escritos de São Marcos.
Com efeito, num fragmento de Papias (bispo de Hierápolis, Padre da Igreja e discípulo de São João Evangelista) em Eusébio, (História Eclesiástica, 3, 39, 15) o ancião, isto é São João Evangelista se manifestou sobre o segundo evangelho: “Marcos, o intérprete de Pedro, escreveu exatamente tudo o que se recordava, os ditos e fatos do Senhor, mas não conforme a ordem. Na verdade ele não tinha ouvido o Senhor nem tinha sido seu discípulo e sim mais tarde acompanhara a Pedro. Este subministrava os seus ensinamentos de acordo com as necessidades dos ouvintes sem pôr em ordem os ditos do Senhor. Assim Marcos não errou em escrever certas coisas do modo como se recordava, com o cuidado de nada omitir e de nada falsificar do que tinha ouvido.” Como vemos é um testemunho de um outro apóstolo e evangelista acerca de que São Marcos foi o autor dum Evangelho.[4]
Vale também recordar que em 1947 foram descobertos, por um beduíno que procurava por sua ovelha desgarrada em Qumran (Palestina) os Manuscritos do Mar Morto. Estes manuscritos foram estudados pelo famoso papirólogo Pe. José O’Callaghan SJ, que chegou à conclusão, a partir de um dos minúsculos fragmentos achados, que continha apenas 6 palavras, datado de aproximadamente 50 d. C., que se tratava do texto de Mc. 6, 52, conclusão esta que também foi aceita por vários outros estudiosos.
A partir deste documento tão antigo fica descartada a hipótese de que este Evangelho tenha sido inventado posteriormente, e ainda o situa de acordo com a tradição Cristã, ou seja, de que o autor realmente é São Marcos que viveu no século I d. C.
Outro argumento a favor da autenticidade dos Evangelhos (de São Marcos e dos demais) é que neles a topografia da Palestina é pelos evangelistas minuciosamente mencionada, assim como a cronologia que é assaz exata, e até mesmo citações de alguns nomes de personagens que realmente existiram e que nos ajudam a definir o contexto: César Augusto (Lc 2, 1); Tibério César, Pôncio Pilatos, Herodes, Filipe, Lisânias… (Lc 3, 1s).[5]
Também não se pode dizer que são mitos e nem que são inventados pois de acordo com o contexto histórico, quem fosse inventar uma fábula para atrair aos “desavisados” certamente não o faria como o fizeram os evangelistas cujos traços são desafiadores e exigentes para a mente humana daquela época: a mensagem de um Deus feito homem e, mais… um Deus que foi crucificado (recordemos que para os Romanos bem como os para gregos, nações dominantes de então, os deuses eram uns “super-heróis” tiranos e que quase não se importavam com os homens), sendo assim escândalo para os judeus e loucura para os gregos (1Cor 1, 23 ). A promessa da Ressurreição ou de re-união da alma com o corpo era contrária ao pensamento grego. Além do mais, a moral cristã, que valorizava a mulher, a criança (mesmo indesejada), a família, o escravo, a estrita monogamia… só poderia encontrar oposições por parte do mundo civilizado.[6]
Donde constatamos que a mensagem do Evangelho é de origem Divina e não pode ter sido produto de ficcionismo de judeus ou de pagãos da antigüidade.
III- Doutrina do Magistério da Igreja
Após termos visto a parte histórica resta-nos conferirmos com a fonte infalível, o Magistério da Santa Igreja Católica.
1) Quanto à autoria da São Marcos.
Diz-nos São Pio X numa “Resposta da Comissão Bíblica, 25 jun. 1912”:
“Pergunta 1: A voz claríssima da tradição, maravilhosamente unânime desde os inícios da Igreja e confirmada por múltiplos argumentos, a saber, pelos testemunhos expressos dos Santos Padres e dos autores eclesiásticos, pelas citações e alusões presentes nos escritos dos mesmos, pelo uso dos antigos hereges, pelas versões dos livros do Novo Testamento, por quase todos os códices manuscritos mais antigos e também por razões internas tiradas do próprio texto dos Livros Sagrados, obriga a afirmar com certeza que Marcos, discípulo e intérprete de Pedro, e Lucas, médico, auxiliar e companheiro de Paulo, são realmente os autores dos Evangelhos que respectivamente lhes são atribuídos
Resposta: Sim” (Dz 3568).
2) Quanto à inspiração Divina.
A Igreja reconhece alguns livros como sendo canônicos e declara que são inspirados por Deus: “ é esta a antiga e constante fé da Igreja, definida também por sentença solene nos Concílios de Florença e de Trento e, por fim, confirmada e mais expressamente declarada no Concílio Vaticano, que promulgou sem restrição: “Os livros da Antigo e do Novo Testamento… têm Deus por autor” (Dz 3293).
E ainda “as coisas divinamente reveladas que se encerram por escrito na Sagrada Escritura e nesta se nos oferecem foram consignadas sob o sopro do Espírito Santo. Pois a Santa Mãe Igreja, segundo a fé apostólica, têm como sagrados e canônicos os livros completos tanto do Antigo como do Novo Testamento, com todas as suas partes, porque, escritos sob a inspiração do Espírito Santo, têm Deus por autor e foram como tais transmitido à Igreja. Na redação dos livros sagrados Deus escolheu pessoas humanas, das quais se utilizou sem tirar-lhes o uso das próprias capacidades e faculdades, a fim de que, agindo Ele próprio neles e por eles, transmitissem por escrito, como verdadeiros autores, tudo e só aquilo que ele próprio quisesse” (Dz 4215).
Como vemos Deus se utilizou (como Ele costuma fazer) de criaturas para propagarem e difundirem seus ensinamentos dados aqui na terra, por Nosso Senhor, respeitando entretanto as características próprias a cada um, de modo que podemos, estudando os Evangelhos perceber o estilo pessoal de cada escritor.
Por Diác. Michel Six, EP
[1] Esta introdução foi baseada no texto da: Escola MATER ECCLESIAE, de Dom Estêvão Bettencourt.
[2] Cf. MONLOUBOU, L.; BUIT, F. M. du. Dicionário biblico universal. 2. ed. São Paulo: Vozes / Santuário, 2003.
[3] Cf. Mc.: 1, 29-31; 5, 37; 9, 2; 11, 21; 14, 33; 13, 3; 16, 7, etc…
[4] Cf. HOEPERS, Mateus, Pe, Dr, Frei. Os santos evangelhos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1963.
[5] Curso Bíblico por correspondência, Escola Mater Ecclesiae, Dom Estevão Bettencourt.
[6] Curso Bíblico por correspondência, Escola Mater Ecclesiae, Dom Estevão Bettencourt.