Epifania significa “manifestação de Deus”. Esta solenidade do calendário litúrgico comemora a Revelação de Jesus aos Reis Magos. A fim de aprofundarmo-nos no estudo da doutrina Católica apresentamos este artigo a fim de que o leitor conheça mais sobre a Revelação e assim compreenda melhor o que a Igreja comemora na Epifania do Senhor.
Redação (04/01/2011, Virgo Flos Carmeli) Quantas e quantas vezes elevamos as vistas para o imenso firmamento erguido sobre nossas cabeças, e nossos olhos não alcançam as distâncias insondáveis dos inúmeros astros do Universo, e assim, nosso olhar se perde nas barreiras de nossa limitação? Qual o motivo pelo qual esse fenômeno se passa? Simplesmente porque nossos olhos são humanos e insuficientes, não abarcam todas as coisas. Por isso, seria plausível que alguém imaginasse, fizesse suposições, enfim, criasse teorias a respeito daquelas realidades que existem acima da atmosfera terrestre.
Imaginemos, por outro lado, um astrônomo que trabalhando com seu instrumento preferido, o telescópio, fosse mais além e sondasse as vastidões do sideral e conhecesse outra galáxia, um novo planeta, ou então, mais uma daquelas nebulosas feéricas; não seria natural que ele tivesse verdades para nos transmitir que para nós são desconhecidas? Verdades essas fundamentadas e fincadas na realidade, e, portanto com muito mais autoridade do que as simples hipóteses de uma pessoa qualquer que se pusesse a conjecturar sobre coisas que ignora.
Pois bem, Deus não inventa teorias e nem forma opiniões sem fundamentos, pelo contrário Ele pode nos transmitir sem margem alguma de erro tudo o que quiser, porque não só vê e conhece, mas é Criador e Senhor de todas as coisas. Ele sim, nos revelou muitas verdades. E, as maravilhas – quase sempre inacessíveis à nossa débil razão -, que Ele nos fez conhecer, são muito maiores e transpõem diversas vezes tudo quanto há de natural, pois, o que Ele ensina são, sobretudo, verdades eternas e sobrenaturais . Assim sendo, é natural que Deus tenha verdades para nos ensinar. É a essa manifestação do Criador à criatura, esse, por assim dizer, levantar do “véu” que até então cobria e salvaguardava certas realidades, antes conhecidas e reservadas somente a Deus, e que em dado momento foram colocadas à disposição dos homens, que chamamos de Revelação.
Entretanto, Deus não é como um astrônomo que transmite a seus alunos sua bela ciência, mas como um Pai que ensina aos seus filhos com uma Bondade incomensurável. O instrumento pelo qual se faz conhecer não é somente um telescópio, porém, Sua própria Palavra Eterna, Imutável, e “mais penetrante do que uma espada de dois gumes” (Hb 4,12).
O que revelou? “Pela revelação divina quis Deus manifestar-se, comunicar-se a si mesmo e os decretos eternos da sua vontade a respeito da salvação dos homens, ‘para os fazer participar dos bens divinos, que superam absolutamente a capacidade da inteligência humana’”. O ápice desta revelação foi atingida quando o próprio Deus se fez homem para viver entre nós.
Era realmente importante que houvesse uma Revelação Divina? Sabemos que há dois caminhos – ambos bem iluminados – que nos faz subir até Deus: o primeiro é iluminado por uma lamparina chamada inteligência humana, que através de raciocínios, reflexões e meditações atinge certas verdades; o segundo é iluminado pelo fulgor de um raio, essa é a “via” da Revelação Divina. Entretanto, São Tomás de Aquino explica que era necessário existir para nossa salvação uma doutrina fundada na Revelação Divina, primeiro, porque estamos ordenados para Deus, como para um fim que ultrapassa a compreensão da razão, como diz Isaías: “O olho não viu, ó Deus, fora de ti, o que preparastes para aqueles que te amam” (Is. 64,3). Ora, é preciso que a pessoa, que dirige suas intenções e suas ações para um fim, antes conheça este fim. Era, pois, necessário para a salvação do homem que essas coisas que ultrapassam sua razão lhe fossem comunicadas por revelação divina.
Ademais, quando o ser humano conhece a Deus apenas com a luz da razão, encontra muitas dificuldades. Além do mais, não pode penetrar sozinho na intimidade do mistério divino. Por isso, Deus quis iluminá-lo com a sua Revelação, não somente sobre verdades que superam a compreensão humana, mas também sobre verdades religiosas e morais que, embora acessíveis por si à razão, podem ser assim conhecidas por todos sem dificuldade, com firme certeza e sem mistura de erro .
Os três Reis Magos, no mais longínquo Oriente, jamais teriam encontrado ao Menino Deus, se o mesmo Deus não tivesse lhes revelado através de uma estrela o caminho a seguir, da mesma maneira, a humanidade, que depois do pecado original vivia longe da pátria celeste, nunca teria chegado a um conhecimento de Deus, se Ele não tivesse revelado. Os olhos do corpo precisam de luz para ver as coisas da terra, e a razão, olho da alma, precisa da luz da revelação divina para ver as coisas de Deus.
Essa Revelação não é senão um corolário do imenso amor de Deus pelos homens, pois Seu amor não se limita quando, benevolamente, dá a existência para cada ser, mas ao contrário, se manifesta continuamente no decorrer dos séculos. “A história da salvação é a Revelação mais eloqüente e concreta do amor do Senhor; mais ainda, constitui o diálogo mais fascinante de amor entre Deus e o homem”.
Quando Deus se manifestou? “No intuito de abrir o caminho de uma salvação superior, manifestou-se a si mesmo desde os primórdios a nossos primeiros pais”.
O píncaro dessa revelação se encontra proclamado no Evangelho de São João, na frase que menciona o maior acontecimento de toda a história, que é a pedra angular sobre a qual todo o edifício da Revelação acha seu sustento e apoio: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1, 14). Durante o tempo em que essa Terra se dignou receber o próprio Criador feito homem, ela viu revelada a Sua face, Sua mentalidade, Sua majestade, Sua santidade, Sua Divindade . Pronto! Nada mais é preciso, tudo está revelado . Pois, como declarou São João da Cruz: “em dar-nos, como nos deu, seu Filho, que é sua Palavra única – e outra não há –, tudo nos falou de uma só vez nessa única Palavra, e nada mais tem a falar, (…) pois o que antes falava por partes aos profetas agora nos revelou inteiramente, dando-nos o Tudo que é seu Filho” . Foi essa a razão que levou São Bernardo a dizer que, a fé católica não é uma religião do livro, mas sim da Palavra de Deus, não de uma palavra escrita e muda, mas do Verbo Encarnado e vivo . Todavia, embora a Revelação esteja terminada, não está explicitada por completo, é dever da fé católica captar e desenvolver gradualmente sua doutrina ao longo dos séculos .
Entretanto, onde encontramos as verdades reveladas? Na Escritura, que é a Palavra de Deus Escrita; e na Tradição, que é a palavra de Deus não escrita, transmitida oralmente. A Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição constituem os dois modos distintos de comunicar essa revelação . Mas, para que se mantivesse protegido, conservado e unido os dados da Revelação, contidos na Bíblia e na Tradição, Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu o Sagrado Magistério, entregando à Igreja o múnus de ensinar (cf. Mt 28, 19.20).
Tudo isto veio da parte de Deus. E de nossa? O que Lhe retribuiremos? Devemos render-Lhe nossa eterna gratidão e amor por Ele nos ter colocado à disposição esse magnífico “telescópio” para assim podermos conhecer, admirar e contemplar os diversos aspectos desse Infinito Universo que é Ele, e também por nos ter oferecido a oportunidade de começarmos, já nessa terra, a participar de Sua glória até chegarmos à eternidade onde o fitaremos face a face. Pois, hoje O vemos como por um espelho e confusamente, mas um dia O veremos tal qual Ele é! (cf. 1Cor 13, 12; 1Jo 3,2).
Lucas Alves Gramiscelli